Expedição realizada pelo PAT Meio-Norte identificou a presença do mutum-pinima no estado do Pará
Pesquisadores conseguiram encontrar seis indivíduos de uma das aves mais ameaçadas de extinção do planeta, o mutum-pinima (Crax fasciolata pinima), algo inédito em relação à espécie no território do Plano de Ação Territorial para Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção do Território Meio Norte (PAT Meio Norte). A expedição organizada no âmbito do PAT Meio Norte foi realizada entre os dias 20 de setembro e 2 de outubro de 2023 e reuniu especialistas de diferentes instituições em busca da espécie.
A atividade ocorreu nos rios Jacundá e Mãe Maria, na Terra Indígena Mãe Maria, ambos no município de Bom Jesus do Tocantins, no estado do Pará. Antes disso, em 2013 e em 2017, dois indivíduos machos já haviam sido registrados no rio Mãe Maria.
O fato surpreendente da expedição realizada no território do PAT Meio-Norte é, justamente, a quantidade de exemplares machos e fêmeas localizados. “Fazer o registro de seis indivíduos diferentes é algo totalmente inédito. Já fizemos dezenas de expedições para localizar esses animais, trabalho há 15 anos para encontrá-los e nunca achamos essa quantidade em uma mesma área. O que aconteceu desta vez é algo totalmente atípico”, reforçou Gustavo Gonsioroski.
Para encontrar as aves, foram instalados 10 gravadores e 10 câmeras trap. Primeiramente, os pesquisadores ouviram o canto das aves e, posteriormente, identificaram a presença delas pelas armadilhas fotográficas. O auxílio dos indígenas Atomre Parkateje e Macedo Canela foi fundamental para o sucesso da expedição.
O biólogo Leonardo Victor, que também integrou a equipe da expedição, contou detalhes do momento que o mutum-pinima foi localizado, definido pelos indígenas que acompanharam os pesquisadores como “cena de filme”. “O bicho veio aparecer só no final da expedição, para a foto. Nos primeiros dias, nós escutamos o canto da ave, então já estávamos na expectativa. No último dia, olhei os registros da armadilha fotográfica e verifiquei a foto de um indivíduo que tinha passado ali há 30 minutos. Então seguimos andando para tentar encontrá-lo, e é impressionante a capacidade dos indígenas de visualizarem os bichos, porque eles sabiam exatamente onde estavam e fomos até por dentro da água para encontrar o pinima. É difícil colocar em palavras o que sentimos quando isso aconteceu, mas foi o ápice da expedição. Todo mundo comemorou”.
Estratégias de conservação
Há a previsão de uma nova expedição nos rios Jacundá e Mãe Maria em dezembro para o levantamento de novas informações sobre o mutum-pinima. As próximas etapas da pesquisa, segundo Laís Morais Rêgo, Superintendente de Biodiversidade e Áreas Protegidas da Sema-MA, coordenadora do PAT Meio Norte, incluem a avaliação da probabilidade do manejo ex situ, que seria a reprodução da ave em cativeiro para posterior reintrodução no habitat, a intensificação das ações de educação ambiental e levantamento de informações sobre a história natural dessa espécie para preencher as lacunas de conhecimento.
“Agora que encontramos o animal no território do PAT Meio-Norte temos uma sequência de ações que serão desenvolvidas, seguindo o planejamento feito na elaboração do plano. Primeiro temos que conhecer mais sobre a história natural dessas aves. Depois vamos fazer um trabalho de educação ambiental junto aos indígenas que vivem na área onde os animais foram encontrados, que é o trabalho in situ. Só então vamos prosseguir com estratégias ex situ para garantir a reprodução dessa espécie fora do ambiente natural”, complementou.
O Supervisor de Estudos e Projetos Aplicados à Conservação da Secretaria de Meio Ambiente do Maranhão (SEMA-MA), João Carlos Costa, acompanhou a viagem e ressaltou a importância dessa descoberta para o desenvolvimento das ações de conservação das espécies. “Por meio dos registros das espécies ameaçadas é possível elaborar políticas públicas voltadas à manutenção da biodiversidade. É primordial que haja não só a continuidade, mas também a expansão de iniciativas como essa”’.
Além do mutum-pinima, pesquisadores localizaram outras seis espécies beneficiadas pelo PAT Meio Norte durante a expedição. São elas: azulona (Tinamus tao), jacupiranga (Penelope pileata), jacamim-de-costas-pretas (Psophia obscura), gavião-real (Harpia harpyja), tiriba-pérola (Pyrrhura coerulescens), ararajuba (Guaruba guarouba) e arapaçú-barrado-do-leste (Dendrocolaptes medius).
Principais ameaças
Segundo o Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, a estimativa é que a população de mutum-pinima seja menor que 50 indivíduos e, seguramente, é um forte candidato a ser o primeiro Cracidae extinto, caso as ações para preservação não sejam intensificadas.
Essa espécie é restrita ao Centro de Endemismo de Belém, uma região rica em biodiversidade, localizada a leste do rio Tocantins, abrangendo o nordeste do Pará e a Amazônia Maranhense. A área é, hoje, a mais descaracterizada de toda a Amazônia, onde o táxon perdeu mais do que 75% de seu habitat original. As principais ameaças são o desmatamento e a caça. Suspeita-se que o declínio populacional tenha sido maior que 80% em três gerações (35 anos) e, por essas razões, o Crax f. pinima foi categorizado como Criticamente em Perigo (CR) de extinção.
PAT Meio-Norte
O Plano de Ação Territorial para a Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção do Território Meio Norte (PAT Meio Norte), que compreende os estados do Maranhão, Pará e Tocantins, é um instrumento desenvolvido no âmbito do projeto Pró-Espécies: Todos contra a extinção para orientar as ações de preservação e redução de ameaças e o risco para a fauna e flora. A iniciativa busca desenvolver ações prioritárias de conservação para 12 espécies-alvo ameaçadas de extinção e outras 60 espécies serão beneficiadas.
O PAT Meio Norte é coordenado pela SEMA-MA, juntamente com o Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins) e o Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do estado do Pará (Ideflor-Bio).
Pró-Espécies
O Pró-Espécies: Todos contra a extinção é uma iniciativa do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, da sigla em inglês para Global Environment Facility Trust Fund) e implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo o WWF-Brasil a agência executora.
O projeto trabalha em conjunto no Maranhão, Bahia, Pará, Amazonas, Tocantins, Goiás, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo para desenvolver estratégias de conservação em 24 territórios, totalizando 62 milhões de hectares. Prioriza a integração da União e dos estados na implementação de políticas públicas, assim como procura alavancar iniciativas para reduzir as ameaças e melhorar o estado de conservação de pelo menos 290 espécies categorizadas como Criticamente em Perigo (CR) e que não contam com nenhum instrumento de conservação.