Anfíbio do Pampa foi encontrado durante expedições do PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste
As crescentes ameaças à biodiversidade mobilizam um grupo de pesquisadores do Rio Grande do Sul em busca de vestígios de uma espécie de anfíbio rara e classificada como quase ameaçada de extinção. O grupo percorreu mais de 1,2 mil quilômetros pelos vastos campos do Pampa entre dezembro de 2023 e junho de 2024 para confirmar a presença do sapinho-de-barriga-vermelha-do-pampa (Melanophryniscus sanmartini) e o resultado foi melhor que o planejado: além de encontrar esses animais nos locais com registros prévios, foi possível identificá-los em novas áreas.
As expedições de campo fazem parte das ações do Plano de Ação Territorial para Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção da Campanha Sul e Serra do Sudeste (PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste), que integra o projeto Pró-Espécies: Todos contra a extinção. O objetivo é fazer o levantamento de dados e informações sobre a espécie para subsidiar a elaboração de estratégias de conservação.
“As expedições são a base para tudo. A gente pode saber o habitat exato do sapinho, onde ele canta, quando ele canta, o que ele come, como que está o ambiente dele ainda e outras informações fundamentais. Quanto mais precisas forem essas informações, melhores serão as nossas decisões na hora de planejar as estratégias de conservação. E isso não só para o sapinho, mas pra maioria das espécies de animais e plantas”, reforçou o biólogo Patrick Colombo, do Museu de Ciências Naturais da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Rio Grande do Sul (SEMA-RS), que participa das pesquisas relacionadas ao animal.
Duas saídas de campo já foram realizadas no âmbito do PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste. As jornadas contam com um planejamento minucioso e vão desde a separação de material para auxiliar na localização dos pequenos anfíbios, até a definição das coordenadas e do período adequado para a atividade. No caso desse sapinho, a melhor época é a chuvosa, quando estão em período de reprodução. “Nessa busca pelo sapinho-de-barriga-vermelha-do-pampa a gente também contou a ajuda de gravadores autônomos que foram instalados em uma das áreas com ocorrência prévia conhecida. Os anfíbios anuros emitem sons espécie- específicos de modo que se sabe qual é a espécie pela vocalização que emite”, complementou Patrick Colombo.
Depois da coleta de dados em campo, os pesquisadores organizam o material na Coleção de Anfíbios do Museu de Ciências Naturais da SEMA-RS e preparam relatórios. A partir da produção de mapas e da verificação de coordenadas onde foram localizados os animais, a equipe faz uma avaliação de novas áreas para futuros monitoramentos e demais estudos.
Características
O sapinho-de-barriga-vermelha-do-pampa é um pequeno anfíbio que mede até três centímetros. Sua coloração varia do castanho ao preto, com uma barriga em tons vibrantes de vermelho, laranja ou amarelo. Ele está dentro de um grupo de espécies muito peculiar e típico do sul da América do Sul.
Os pesquisadores ainda não sabem exatamente do que eles se alimentam, o que será possível graças às expedições do PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste. Aparentemente, eles comem ácaros e formigas, de onde sequestram toxinas que usam para defesa química contra predadores e patógenos.
Uma das principais ameaças a essas espécies é a perda de habitat devido à expansão agrícola. “Esses sapinhos utilizam corpos d’água temporários, poças e pequenos riachos para se reproduzir. Esses habitats só se tornam “visíveis” depois de períodos de chuvas, então quando estão secos é muito mais fácil convertê-los em lavouras, estradas e até serem aterrados, o que de fato acontece, e coloca essa e outras espécies de sapinhos-de-barriga-vermelha em risco”, adiantou o biólogo.
Para garantir a preservação dos sapinhos, é urgente a criação e implementação de normas que estabeleçam limites para as lavouras evitando avanço sobre as áreas úmidas campestres, e de corredores ecológicos. Patrick Colombo avalia, ainda, que é preciso acelerar os processos do Cadastro Ambiental Rural (CAR), a averbação das reservas legais e a criação de unidades de conservação levando em consideração as áreas úmidas onde o sapinho e outras espécies ocorrem.
“Iniciativas como o Pró-Espécies são um sopro de esperança que nós temos frente a todos os constantes retrocessos ambientais que estamos vivenciando. Essas ações deveriam ser incorporadas a políticas públicas sérias de proteção da nossa fauna e flora, deveriam entrar nas rotinas de órgãos ambientais, constituindo estratégias permanentes ou de longo prazo para conservação da natureza”, reforçou.
Conservação
O PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste, coordenado pela SEMA-RS, tem o objetivo de melhorar o estado de conservação de 30 espécies ameaçadas (16 espécies da flora e 14 espécies da fauna) e seus ambientes por meio da valorização e promoção de práticas sustentáveis e da participação social. O território abrange 18 municípios e cobre uma área de mais de 36 mil km2.
O Pró-Espécies é financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo o WWF-Brasil a agência executora.
O projeto trabalha em conjunto com 12 estados do Brasil (AM, MA, BA, PA, TO, GO, SC, PR, RS, MG, SP, RJ e ES) para desenvolver estratégias de conservação em 24 territórios, totalizando 62 milhões de hectares. Prioriza a integração da União e estados na implementação de políticas públicas, assim como procura alavancar iniciativas para reduzir as ameaças e melhorar o estado de conservação de pelo menos 290 espécies categorizadas como Criticamente em Perigo (CR) e que não contam com nenhum instrumento de conservação.