Novas espécies de canelas-de-ema são descobertas e impulsionam conservação no Espinhaço Mineiro

Publicado em 25 de julho de 2024
Novas espécies de canelas-de-ema são descobertas e impulsionam conservação no Espinhaço Mineiro Créditos: Danilo Zavatin (Espécie: Vellozia flavida)

Plantas foram localizadas nos campos rupestres do norte de MG e estão na categoria Criticamente em Perigo

Duas novas espécies de canela-de-ema foram descobertas por pesquisadores do Plano de Ação Territorial para conservação de espécies ameaçadas de extinção do Espinhaço Mineiro (PAT Espinhaço Mineiro). As espécies indicadas na categoria Criticamente em Perigo por serem microendêmicas foram localizadas durante expedição organizada no âmbito do Pró-Espécies: Todos contra a extinção, na vegetação dos campos rupestres no norte de Minas Gerais. 

As novas espécies, Vellozia flavida e Vellozia formosa, foram descritas e recém-publicadas na revista internacional Phytotaxa. Segundo o pesquisador e autor principal da descoberta, Renato Magri, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, a publicação, além de oficializar o nome da planta, amplia as estratégias de conservação. “Antes da publicação, essas espécies não tinham um status científico oficial. Agora, além de garantir seus nomes científicos, também fortalecemos as estratégias de conservação que são essenciais para a manutenção da biodiversidade local”, reforçou. 

Essas plantas são reconhecidas pela beleza de suas flores, em geral lilás a brancas, mas nessa descoberta houve novidades, incluindo uma rara flor amarela, nomeada Vellozia flavida. Essa é apenas a terceira espécie de Vellozia com essa característica, gênero que conta com 130 espécies de plantas que geralmente ocupam regiões de altitude elevada. A outra espécie encontrada faz homenagem ao seu local de ocorrência na região do Pico da Formosa, denominada Vellozia formosa, que foi coletada pela primeira vez em 2017. Renato Magri revelou, ainda, que esse trabalho teve início com os estudos do professor no Departamento de Botânica da Universidade de São Paulo Renato Mello-Silva (in memorian), que dedicou suas pesquisas às canelas-de-ema.

Ainda de acordo com o pesquisador, as plantas estão em uma área de distribuição muito restrita. Essa característica foi determinante para a categorização, pois se o habitat delas for destruído, não se conhece outro local onde elas ocorrem. “Além disso, a Vellozia flavida, que ocorre no Morro das Marombas, foi coletada em um local que estava demarcado para prospecção de mineração de quartzito; já a outra espécie, Vellozia formosa, também corre perigo devido ao interesse da indústria de energia eólica em instalar turbinas nessa montanha”, complementou Renato Magri. 

O PAT Espinhaço Mineiro é coordenado pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF-MG) e foi desenvolvido como uma estratégia integrada para a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais dos ecossistemas presentes na região da Reserva da Biosfera da Serra do Espinhaço. A analista ambiental do instituto, Gabriela Brito, enfatizou a necessidade urgente de proteger essas espécies descobertas por meio da criação de Unidades de Conservação na região e iniciativas educacionais que promovam a conscientização sobre a importância dos campos rupestres.  

Expedições

Para encontrar as espécies, foi preciso contar com o empenho dos pesquisadores. “Eu sabia da existência dessas espécies novas na região, mas não sabia que o acesso seria tão difícil. A missão de coleta em campo para encontrar as plantas foi bastante pesada, por causa do relevo, bem como da necessidade de achar as plantas com flores”, disse Renato Magri. 

O trabalho desenvolvido nas expedições botânicas se parece muito com o trabalho dos naturalistas oitocentistas. Mas, segundo o pesquisador Renato Ramos, membro do Grupo de Assessoramento Técnico do PAT Espihaço Mineiro, diferente daquela época, os cientistas estão vinculados a instituições de ensino e pesquisa e projetam as suas descobertas para o mundo. “Além disso, os dados e tecnologias atuais, facilitadas pela internet, nos permitem mapear, goerreferenciar e cruzar informações, além de acelerar os métodos da pesquisa botânica clássica. Ainda seguimos fazendo esse tipo de botânica, mas não mais em lugares distantes, desconectados da produção científica. Estamos em contextos integrados, envolvendo diversos parceiros com estruturas de pesquisa e conservação adequadas, em diálogo constante com a comunidade local”, reforçou. 

Ambiente único

Recentemente, nessa mesma área, pesquisadores descobriram uma nova espécie: Uaizeitona, o Chionanthus monteazulensis. Os resultados demonstram a importância da preservação da Cordilheira do Espinhaço e das ações desenvolvidas no âmbito do Pró-Espécies. Todo ano são descobertas várias espécies de plantas nos campos rupestres desse local, que abriga pelo menos 7.750 espécies nativas, com mais de mil espécies endêmicas. 

Minas Gerais é o estado brasileiro com a maior quantidade de espécies da flora, com cerca de 14.000 espécies nativas, sendo que 20% delas são endêmicas. No Brasil, cerca de 200 espécies novas são publicadas por ano e muitas delas estão localizadas nas serras de Minas Gerais. 

Para Renato Ramos, a estratégia de conservação adotada pelo Pró-Espécies, que tem foco no território e não apenas nas espécies-alvo, é um grande diferencial, com impactos ainda mais efetivos para a preservação do meio ambiente. “Muitas vezes, as estratégias de conservação privilegiam mais a fauna, pelo impacto que causa nas pessoas, sensibilizando e engajando. Ao se pensar formas de proteger a vegetação e as plantas, na verdade estamos pensando em todos os organismos ali presentes, bem como as relações ecológicas entre eles. No contexto da aplicação de recursos para a conservação, além de se divulgar, educar e mobilizar os atores locais, os investimentos realizados também nos permitem fazer pesquisa de base, com aplicação direta”, complementou. 

O território do PAT Espinhaço Mineiro abrange uma área com 105.251 km2, perpassando os biomas Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica. São alvo desse PAT 24 espécies CR lacunas, sendo 19 espécies da flora, 3 espécies de peixes e 2 espécies de invertebrados, entretanto, os efeitos positivos das ações do plano também serão refletidos em pelo menos 1787 outras espécies ameaçadas presentes no território.

Pró-Espécies

O projeto Pró-Espécies é financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo o WWF-Brasil a agência executora.

O projeto trabalha em conjunto com 12 estados do Brasil (MA, BA, PA, TO, GO, SC, PR, RS, MG, SP, RJ e ES) para desenvolver estratégias de conservação em 24 territórios, totalizando 62 milhões de hectares. Prioriza a integração da União e estados na implementação de políticas públicas, assim como procura alavancar iniciativas para reduzir as ameaças e melhorar o estado de conservação de pelo menos 290 espécies categorizadas como Criticamente em Perigo (CR) e que não contam com nenhum instrumento de conservação.

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