Ação coordenada pelo PAT Xingu prevê a preservação de animais que vivem em cavernas 

Publicado em 27 de setembro de 2023
Ação coordenada pelo PAT Xingu prevê a preservação de animais que vivem em cavernas  Créditos: Acervo IDEFLOR-Bio / PAT Xingu

Expedição contou com a participação de pesquisadores de diferentes instituições e  levantou informações sobre espécies ameaçadas de extinção

A presença de animais em risco de extinção e de espécies que ainda nem foram descritas pela ciência nas cavernas que fazem parte do território do Plano de Ação  Territorial para Espécies Ameaçadas de Extinção do Xingu (PAT Xingu) despertou a necessidade de aprofundar o conhecimento sobre a fauna presente nesses ambientes. Para isso, pesquisadores de diferentes instituições realizaram, em agosto, uma expedição de 20 dias para levantar informações e elaborar estratégias para a preservação desses locais que são fundamentais para a manutenção da biodiversidade brasileira. 

A ação foi coordenada pelo Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade (IDEFLOR-Bio) e contou com a presença de representantes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade Federal do Pará- Bragança (UFPA).

Na primeira parte da viagem, além de um encontro com representantes das secretarias municipais de meio ambiente que integram a área do PAT Xingu – como Vitória do Xingu, Medicilândia e Altamira -, para apresentar informações sobre o uso das cavernas, houve ainda uma visita técnica na caverna do Limoeiro, em Medicilândia, município do Pará, onde vive o Troglobius brasiliensis, um inseto com seis pernas, sem olhos ou pigmentos, e que não era registrado há mais de 25 anos. O animal é uma das espécies-alvo do plano e está classificado como Criticamente em Perigo (CR) de extinção. 

No segundo período da expedição, especialistas em fauna cavernícola visitaram outras 5 cavernas da região para verificar o estado de conservação. A conclusão, segundo Nívia Pereira, representante do IDEFLOR-Bio e coordenadora técnica do PAT Xingu, é que a preservação das florestas no entorno desses ambientes é fundamental para a manutenção da biodiversidade. “Percebemos que o entorno das cavernas está muito desmatado e que, de fato, a do Limoeiro, em Medicilândia, que tem uma quantidade florestal significativa e preservada, possibilitou a manutenção de uma microfauna bem diferenciada. Esse é um dos resultados que deverão aparecer nos trabalhos científicos: um  ecossistema bem estruturado é fundamental para a fauna”, reforçou. 

Estratégias para proteção 

O analista ambiental do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (Cecav) do ICMBio, Daniel Mendonça, ressaltou a importância desse tipo de levantamento, pois traz novas informações sobre a fauna subterrânea da região, o que possibilita uma melhor gestão para a preservação do meio ambiente. “Conhecendo um pouco mais sobre a fauna e a realidade deste território, teremos a possibilidade de propor estratégias com foco na proteção. As ações do PAT Xingu vão diminuir lacunas de conhecimento e isso ajuda a obter elementos para justificar a conservação e uso regrado dessa terra, e até a criação de Unidades de Conservação”, complementou. 

O pesquisador da UEPB, Douglas Zeppelini, participou da segunda etapa da expedição e visitou, mais uma vez, a caverna do Limoeiro, onde vive o Troglobius brasiliensis. “A princípio, o foco do PAT Xingu era a caverna do Limoeiro, que é onde está a espécie-alvo do plano, classificada como CR Lacuna. Mas pra gente se certificar de que ela só existe nessa caverna, precisamos olhar as outras. Essa é uma forma de ter certeza do endemismo dela”, argumentou. 

Douglas Zeppelini explicou, ainda, que a partir dessas informações será possível ampliar as pesquisas sobre outros temas relacionados às cavernas e aos animais que habitam esses ambientes. “O que a gente viu nas cavernas menores é que, apesar da degradação, a gente encontra bichos por causa do HSS, que é o Habitat Subterrâneo Superficial. Estudos apontam que esses espaços, em determinados tipos de rochas, conectam cavernas em grandes extensões. Estamos só começando a entender o potencial de conectividade desses ambientes”, completou.

 

Resultados da expedição

A pesquisa sobre fauna cavernícola também possibilitará uma avaliação sobre os vetores de pressão à conservação das espécies-alvo do PAT Xingu. No território do plano, as principais ameaças estão relacionadas à expansão da fronteira agrícola e pecuária, desmatamento ilegal, incêndios florestais, mineração e construção de empreendimentos hidrelétricos. “Temos que verificar se os vetores de pressão que identificamos no momento da elaboração do plano como justificativa para classificar as espécies como em risco de extinção continuam os mesmos, ou se existem novos impactos que contribuem para aumentar as ameaças. E nesse caminho é fundamental contar com a parceria de órgãos como o ICMBIO/Cecav, que se dedica, justamente, a pensar em estratégias que preservem as cavernas”, reforçou Renata Emin, assessora técnica do PAT Xingu. 

Outro ponto destacado por Renata Emin foi a articulação com os proprietários das terras onde estão localizadas as cavernas. “Precisamos promover as articulações, demonstrando as vantagens da preservação, sempre pensando no bem comum e na conservação das espécies”. 

Os procedimentos para a coleta dos materiais durante as expedições também serão revistos e avaliados. “Uma parte importante desse trabalho e que vejo como um resultado do trabalho desenvolvido pelo PAT Xingu é a avaliação dos protocolos de pesquisas. Vamos verificar como as amostras estão sendo coletadas, armazenadas e tombadas no museu, porque tudo isso interfere no conhecimento gerado”, adiantou Nivia Pereira. 

Cavernas no Brasil  

O trabalho de pesquisas nas cavernas no Brasil é coordenado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas, o CECAV e, por isso, a participação de representantes do ICMBio na expedição do PAT Xingu já estava prevista desde a elaboração do plano. Esses ambientes são bens da União, segundo a Constituição Federal, e seus ecossistemas e patrimônio genético devem ser preservados para gerações futuras.

De acordo com Daniel Mendonça, existem aproximadamente 23 mil cavernas cadastradas no Brasil, mas há uma estimativa de que em todo o território existam 150 mil ambientes cavernícolas em diferentes tipos de rochas. “A gente faz os levantamentos e orientações durante as vistorias nas cavernas para auxiliar na elaboração dos planos de manejo espeleológico. É bem comum o turismo sustentável nesses ambientes, que precisa ser autorizado. Auxiliamos na elaboração das regras de visitação, verificamos os percursos nas cavernas, os perigos e riscos, mas antes disso é importante fazer o levantamento sobre as espécies que habitam nos locais para garantir que elas continuem existindo”, explicou. 

O analista ambiental contou ainda que chamou a atenção o número de cavernas com alto potencial turístico na região do PAT Xingu e que a partir de um levantamento massivo sobre a fauna cavernícola será possível avaliar o potencial de cada uma delas. “Fizemos uma vistoria na caverna do Limoeiro e vamos apresentar nosso relatório sobre a potencialidade do uso e cuidados que são necessários para proteger esse ambiente. O interessante é que não esgotamos os assuntos após essa expedição. Nós demos mais um passo para levantar informações em locais que não tínhamos dados. Para se ter uma ideia, 80% do conhecimento de cavernas (no Brasil) está relacionado àquelas formadas por rochas calcárias e temos poucos dados em outros tipos de rochas, como essa do PAT Xingu (arenito)”, reforçou Daniel Mendonça.

 

Todos contra a extinção

O PAT Xingu visa a conservação de oito espécies-alvo, sendo quatro da flora e quatro de fauna, e de seus habitats e integra o projeto Pró-Espécies: Todos contra a extinção, que tem o objetivo de adotar ações de prevenção, conservação, manejo e gestão que minimizem as ameaças e o risco de extinção de espécies. 

O Projeto Pró-Espécies foi lançado em maio de 2018 e trabalha em conjunto com 13 estados do Brasil (MA, BA, PA, AM, TO, GO, SC, PR, RS, MG, SP, RJ e ES) para desenvolver estratégias de conservação em 24 territórios, totalizando 62 milhões de hectares. O projeto é financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, da sigla em inglês para Global Environment Facility Trust Fund), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo o WWF-Brasil a agência executora.

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