Expedições buscam preservar cactos ameaçados de extinção

Publicado em 30 de agosto de 2024
Expedições buscam preservar cactos ameaçados de extinção Créditos: Parodia rudibuenekeri Foto: Ricardo Ramos

Pesquisadores do RS intensificam ações para localizar novas ocorrências das espécies e mapear principais ameaças

Com o objetivo de intensificar os esforços para a conservação de cactos ameaçados de extinção, pesquisadores do Rio Grande do Sul percorreram os campos nativos dos Pampas em busca de quatro espécies classificadas como Criticamente em Perigo (CR). A urgência em definir medidas para a preservação dessas plantas é que, apesar da resiliência e da extraordinária capacidade de sobreviver e se reproduzir em condições adversas, os cactos vêm sofrendo com uma série de ameaças como perda de habitat, coleta ilegal e invasão de espécies exóticas. As expedições ocorreram no âmbito do Plano de Ação Territorial para Conservação de Espécies Ameaçadas de Extinção do Território Campanha Sul e Serra do Sudeste (PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste) e os resultados servirão de base para o desenvolvimento de políticas públicas estratégicas, focadas na conservação e na recuperação das populações que estão enfraquecidas. 

A pesquisadora do Jardim Botânico do Rio Grande do Sul Josy Zarur de Matos explicou que os pampas gaúchos são o quarto maior centro de endemismo de cactos do Brasil, ficando atrás da Caatinga, Cerrado e da Mata Atlântica. A região abriga 65 espécies, quase 29% do total de espécies encontradas no país, e 80% está classificada em alguma categoria de ameaça na Lista de Espécies Ameaçadas do RS. “Falar em meio ambiente, hoje em dia, é falar em espécies ameaçadas. São muitas as ameaças, sendo que a perda de habitat é uma das principais. O interessante é que essas espécies são resilientes. Quando as populações sentem que estão ameaçadas, se reproduzem com mais rapidez. Esse processo é biológico e natural. Observamos, muitas vezes, que a planta principal morreu mas, na volta, está cheio de brotos. Mas isso não impede que populações inteiras desapareçam do ambiente” complementou.

A jornada para localizar as espécies-alvo do plano de ação (Frailea mammifera, Parodia gaucha, Parodia neoarechavaletae e Parodia rudibuenekeri), requer planejamento e organização por parte dos biólogos e especialistas. Josy de Matos esclareceu que, primeiramente, é necessário fazer um mapeamento da distribuição potencial para cada espécie, avaliando características ambientais. Além disso, a cada expedição, é preciso retornar aos locais previamente conhecidos para confirmar a presença das plantas e seu estado de conservação. 

Em algumas viagens, foram identificados até cinco novos pontos de ocorrência de cactos. No entanto, em outras ocasiões, a equipe se deparou com áreas já convertidas em plantações de soja ou silvicultura, ressaltando as dificuldades na conservação dessas espécies, e locais que antes abrigavam um grande número de indivíduos sem nenhum exemplar. 

“Nós visitamos essas áreas antigas, já conhecidas, para ver e descrever como está a população do cacto. É importante termos essas informações detalhadas até mesmo para passar aos órgãos licenciadores”, reforçou. 

A pesquisadora adiantou, ainda, que no caso da Parodia rudibuenekerio trabalho será voltado também para o desenvolvimento de ações de educação ambiental. “Essa espécie só ocorre em um ponto específico, no meio de umas rochas, em locais propícios para a prática de alpinismo. É preciso conscientizar as pessoas sobre a presença da espécie ameaçada de extinção para garantir sua sobrevivência”. 

Pesquisadores em coleta de campo. Foto: Mariano Pairet

Espécies exóticas

Um dos desafios detectados pelos pesquisadores é a invasão de espécies exóticas, principalmente do arbusto conhecido como tojo (Ulex europaeus), que tem ameaçado áreas de afloramentos rochosos, habitat natural de muitos cactos. Em uma das áreas visitadas, a invasão foi tão intensa que prejudicou a presença de gado e o crescimento de outras plantas nativas.

“Essa espécie, que pode medir até um metro e meio de altura, está tomando conta do RS. Ela vai invadindo e destruindo o campo, inclusive em áreas de morro, e é super difícil de controlar. Nem o uso de fogo é eficaz, pois as sementes germinam ainda mais facilmente após a queima.  As flores são amarelas e as folhas contém espinhos rígidos que dificultam o manejo e podem causar a morte de animais silvestres, que ficam presos entre os arbustos”, contou. 

Esforço para sobrevivência

Outra atividade importante realizada durante o trabalho de campo é a coleta de sementes para reprodução, visando a conservação ex situ, com o intuito de desenvolver pesquisas que possibilitem reintroduzir as plantas em seus habitats naturais, caso necessário. 

As expedições, portanto, são apenas o início de um processo longo que envolve a catalogação das espécies, a análise em laboratório e a implementação de estratégias de conservação. No Jardim Botânico, onde as coleções de cactos são mantidas, os esforços de germinação e cultivo são essenciais para garantir que essas espécies sobrevivam às ameaças que enfrentam.

Além de cumprir com os objetivos definidos pelo PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste, as expedições ampliam a compreensão da biodiversidade local. Josy de Matos ressalta que as equipes fazem a coleta, quando possível, das espécies-alvo, mas têm um olhar mais global, para identificar outras plantas importantes, pouco conhecidas e também ameaçadas, contribuindo com dados valiosos para a conservação ambiental. “O número de plantas inseridas na coleção do Herbário Alarich Rudolf Holger Schultz (HAS) do Museu de Ciências Naturais, onde são depositadas as amostras das espécies estudadas, aumentou muito em função dos trabalhos do plano de ação e quem ganha é a biodiversidade”. 

Conservação

O PAT Campanha Sul e Serra do Sudeste, coordenado pela Secretaria de Meio Ambiente do RS, tem o objetivo de melhorar o estado de conservação de 30 espécies ameaçadas (16 espécies da flora e 14 espécies da fauna) e seus ambientes por meio da valorização e promoção de práticas sustentáveis e da participação social. O território abrange 18 municípios e cobre uma área de mais de 36 mil km2. 

O Pró-Espécies é financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), sendo o WWF-Brasil a agência executora.

O projeto trabalha em conjunto com 12 estados do Brasil (AM, MA, BA, PA, TO, GO, SC, PR, RS, MG, SP, RJ e ES) para desenvolver estratégias de conservação em 24 territórios, totalizando 62 milhões de hectares. Prioriza a integração da União e estados na implementação de políticas públicas, assim como procura alavancar iniciativas para reduzir as ameaças e melhorar o estado de conservação de pelo menos 290 espécies categorizadas como Criticamente em Perigo (CR) e que não contam com nenhum instrumento de conservação.

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