Plano de monitoramento e prevenção da espécie exótica entra no segundo ciclo
O javali, uma das espécies exóticas invasoras mais danosas do mundo, chegou ao Brasil na década de 1960 pela região sul e, atualmente, está presente em mais de dois mil municípios brasileiros. Os javalis selvagens e os javaporcos, resultantes do cruzamento de javalis selvagens com diferentes linhagens de porcos domésticos, são nativos da Europa, Ásia e norte da África e representam uma verdadeira ameaça para biodiversidade e para a agropecuária, pois ocasionam danos à flora e fauna nativa, atuam no desencadeamento de processos erosivos e assoreamento de corpos d’água podendo inclusive comprometer a qualidade dos recursos hídricos, são responsáveis por prejuízos na produção agrícola e representam um grave risco sanitário para a atividade pecuária.
O controle da população de javalis no Brasil é um dos compromissos assumidos no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB, da qual o país é signatário, e para isso foi elaborado o Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Javali. O primeiro ciclo das atividades para conter a expansão territorial e demográfica desses animais no país teve início em janeiro de 2017 e a segunda etapa começou a ser desenhada em junho deste ano.
“A oficina de elaboração do segundo ciclo ocorreu entre 12 e 16 de junho na Escola Nacional de Gestão Agropecuária e um dos objetivos do encontro foi reunir diversos atores interessados na temática com relação ao controle do javali para verificar avanços a partir dos objetivos estabelecidos no primeiro ciclo e quais as principais dificuldades e limitações constatadas no período. A partir dessa reunião vamos construir as novas métricas para elaboração da próxima etapa”, adiantou Bruno Jackson, analista ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que é o órgão que coordena o Plano Javali, junto com o Ministério da Agricultura.
Representantes de órgãos estaduais de meio ambiente, de universidades, Embrapa, Ministério da Saúde, Exército Brasileiro também participam das discussões sobre o plano, que integra a Estratégia Nacional sobre Espécies Exóticas Invasoras e tem apoio do Pró-Espécies: Todos contra a Extinção, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, implementado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e tem o WWF-Brasil como agência executora.
Regulamentações e acompanhamento
Dentre as constatações, estão a necessidade de definir a regulamentação do emprego de cães na atividade de controle de javalis para impedir a prática de maus tratos, o aprimoramento das regras relacionadas ao armamento com a preparação de um documento técnico quanto a arma e calibre utilizados no manejo e revisão das normas vigentes, e o acompanhamento sistemático sobre o tamanho da população dos javaporcos no Brasil. “Esse tipo de informação define, por exemplo, o quanto de esforço precisamos empenhar para combater uma invasora”, complementou o analista do Ibama.
Além disso, o segundo ciclo prevê um estímulo ainda maior a pesquisas para aplicar novos métodos de controle no Brasil, a formalização de parcerias com serviço de extensão rural para disseminar boas práticas na atividade e a celebração de Acordo de Cooperação Técnica entre Ibama e Ministério da Agricultura visando o fortalecimento das ações, desde a prevenção para impedir o avanço em áreas ainda não impactadas aos procedimentos necessários de controle e erradicação.
“Todas as melhorias envolvem questões operacionais, como o número de pessoas trabalhando na área, mas também atuamos na questão de articulação com as diversas esferas: União, Estados e municípios, e com os órgãos relacionados ao Sisnama (Sistema Nacional de Meio Ambiente), do setor agropecuário e da área da segurança pública para compor conosco esse esforço no acompanhamento dessas ações. Isso é fundamental para o fortalecimento das atividades, bem como a conscientização e sensibilização da sociedade sobre a problemática”, reforçou Bruno Jackson.
Primeiro ciclo
O primeiro ciclo do Plano Javali, planejado com horizonte temporal de 25 anos, definiu sete objetivos específicos que vão desde a revisão, criação e fortalecimento dos instrumentos normativos voltados ao controle dessa espécie, passando pela prevenção de sua expansão geográfica até o monitoramento dos impactos socioeconômicos e ambientais.
Os problemas causados por essa espécie são muitos: destruição das lavouras, transmissão de doenças, como leptospirose e febre aftosa, dispersão de ervas daninhas e predação de animais e sementes são alguns exemplos. Esses animais alteram a flora nativa, são predadores da fauna nativa e danificam solo e cursos d’água. Além disso, representam riscos de epidemia, pois podem ser reservatórios de doenças que afetam a suinocultura e a indústria da carne. Ações humanas podem contribuir de maneira relevante para amplificar os problemas causados pela espécie invasora, como a criação ilegal de javalis e javaporcos e a soltura intencional dos animais para fins de caça recreativa em locais onde a espécie ainda não se estabeleceu.
De acordo com Bruno Jackson, a preocupação com as espécies exóticas invasoras tem ganhado cada vez mais importância no Brasil, porém essa temática é relativamente recente em termos de política pública. Segundo Jackson, os documentos internacionais, de convenções de biodiversidade e especialistas da academia são unânimes em reforçar que o melhor é atuar na prevenção do que na erradicação do problema. “Uma das características das espécies exóticas invasoras é a capacidade de adaptação ao ambiente. Por serem mais generalistas, vão conseguir se alimentar, se reproduzir e obter os melhores recursos de descanso e proteção. E uma vez que elas se estabelecem e têm esse potencial reprodutivo, passam a ocupar os espaços e eliminar indivíduos das espécies nativas. Então o esforço para o combate da espécie exótica quando ela já está no ambiente é muito elevado. O Plano Javali vem no sentido de tentar impedir que o animal se disperse ainda mais e de forma descontrolada”, argumentou o analista.
As ações do plano visam, ainda, proteger áreas prioritárias, como unidades de conservação e de grande relevância ecológica ou econômica, como as lavouras, para minimizar os impactos. “Estamos pensando no futuro e a ideia é tentar reduzir o número de indivíduos e conter essa população para que ela não cause tantos danos”, concluiu.
Espécies exóticas
As espécies exóticas invasoras têm sido transportadas, de forma intencional e acidental, entre regiões, países e ecossistemas num ritmo crescente devido à intensificação do comércio, de viagens e do turismo. Estão presentes em praticamente todos os ecossistemas, ameaçando a sobrevivência de espécies nativas e o equilíbrio dos ambientes naturais.
Até o momento, o MMA juntamente com diversos setores (setor público, econômico e terceiro setor), identificou aproximadamente 444 espécies exóticas invasoras presentes que impactam diretamente a biodiversidade no país, sendo cerca de 254 espécies da fauna e 190 da flora. Além disso, foram identificadas cerca de 64 espécies exóticas invasoras de fauna e 48 da flora ausentes ou contidas com risco de invasão no Brasil, listadas como prioritárias para ações de alerta, detecção precoce e resposta rápida.
Os impactos sobre a biodiversidade causados por invasões biológicas afetam a provisão de serviços ambientais, a economia, a saúde e a conservação do patrimônio genético e natural. Reduzir esses impactos requer uma abordagem interdisciplinar e é justamente esse o trabalho desenvolvido a partir da Estratégia Nacional para Espécies Exóticas Invasoras, com apoio do Pró-Espécies: Todos contra a Extinção.
O Pró-Espécies tem o objetivo de implementar políticas públicas voltadas à conservação de pelo menos 290 espécies brasileiras categorizadas como ameaçadas de extinção e alavancar iniciativas que reduzam as ameaças à biodiversidade brasileira. O projeto foi estruturado em quatro componentes, desenhados de forma a combater as principais causas de extinção das espécies: perda de habitat, extração ilegal e espécies exóticas invasoras.